“Hipocrisias, vícios e virtudes”,
Helio Schwartsman
SÃO PAULO
O que me fascina na
mente humana é sua capacidade de dissolver contradições e, com isso,
transformar o que todos veem como inequívocas violações morais, se não em
virtudes, ao menos em deslizes menores – quando não em mera intriga de
opositores.
Esse roteiro se aplica a todos, do assassino que se justifica
apelando aos maus-tratos a que foi submetido na infância até o sujeito que
recorre à neurociência para explicar por que não pôde deixar de olhar para as
pernas da moça bonita. Mas, se há uma categoria para a qual ele cai como uma
luva, é a dos políticos e religiosos que, flagrados entre fatos inegáveis e
declarações desastradas, vão se enredando em escândalos com potencial de
destruir suas carreiras. Esse é o caso do ainda deputado André Vargas e, um
pouco antes, o do ex-senador Demóstenes Torres. Mas a lista poderia ser
ampliada para incluir representantes de todas as confissões e ideologias.
Por
uma combinação de sadismo com igualitarismo, nós nos deleitamos ao ver figuras
poderosas caindo em desgraça. É preciso, porém, cuidado para não incorrer no
mesmo erro que eles e nos imaginarmos imunes a essas vicissitudes. É verdade
que a maioria de nós, por não posar de baluartes da ética, jamais tombaremos
tão feio. Mas isso não significa que não lidemos diariamente com nossas
pequenas e médias hipocrisias. Uma série de experimentos psicológicos revela
que, sob as condições certas, isto é, com a garantia de que não seremos
apanhados e qualquer coisa que se assemelhe a uma justificativa, a maioria de
nós trapaceia. Pior, acabamos acreditando, ainda que claudicantemente, nessa
justificativa. Se não fosse assim, seríamos incapazes de cultivar uma autoimagem
pelo menos aceitável. Mais do que a homenagem que o vício presta à virtude, a
hipocrisia é a forma que o cérebro encontrou para lidar com as complexidades e
ambiguidades que povoam nossas vidas.
folha.uol.com.br
Compreendendo o texto
1. No artigo, Schwartsman defende a tese segundo a qual o ser capaz de dirimir contradições, o homem
consegue converter violações morais em pequenos vícios ou até mesmo em
virtudes.
2. Para Schwartsman, os que mais acabam com as contradições e
cometem violações morais são: Todos,
mas, particularmente, os políticos e religiosos que, flagrados entre fatos
inegáveis e declarações desastradas, vão se enredando em escândalos com
potencial de destruir suas carreiras.
3. A expressão “Esse roteiro” refere-se à capacidade de dirimir as contradições e
transformar as violações morais em virtudes ou em deslizes menores.
4. O autor afirma que nós sentimos prazer ao ver
pessoas ilustres transformando inequívocas violações morais em pequenos delitos
e, por isso, caindo em desgraça.
Mas
adverte que nós não estamos imunes a essas eventualidades.
Para o autor, figuras
ilustres metem-se em escândalos capazes de destruir suas carreiras justamente
por conta dessa capacidade que o ser humano tem de dissolver as contradições e
isso, por sua vez, permite que as violações morais sejam consideradas pequenos
delitos ou até mesmo intriga da oposição.
Os experimentos
psicológicos citados pelo autor demonstram que a maioria, em condições ideais,
está propensa a cometer pequenos deslizes.
O autor revela-se
pessimista sobre a conduta das pessoas de uma forma geral, concluindo que a
hipocrisia é uma forma que o cérebro encontrou para lidarmos com situações
complexas e ambíguas.
5. Alguns dos assuntos
explorados no texto podem ser relacionados aos ditados populares
A ocasião faz o
ladrão.
Todo homem tem seu
preço.
Quem tem telhado de
vidro não deve atirar pedra ao do vizinho.
6. Imagine a situação: “Uma dona de casa acabou de preparar o
almoço e convidou seus familiares para iniciarem a refeição da seguinte forma:
‘___Vamos comer pessoas?’ O filho, adolescente, aproveitou o ensejo e
respondeu: Credo, mãe!”.
Com base no exposto, analise corretamente a situação:
A frase dita pela dona de casa é ambígua, isto é, permite
dupla interpretação devido ao sentido conotativo do verbo comer, usado em
situações informais. Para significar o que a mãe intencionava de fato, a frase
deveria ser reescrita da seguinte forma: “__Vamos comer, pessoas?”.
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